sábado, dezembro 18, 2004

Os Gatos de Betty

Este trabalho foi realizado no âmbito da cadeira de Seminário de Escrita Criativa e Interactiva. O objectivo era reproduzir um diálogo de duas amigas acerca dos gatos de uma delas.

Martha aproximava-se mais uma vez daquele atrelado. O terreno baldio que o rodeava, cheio de ervas e mato, tornava ainda mais deprimente o degradado estado da caravana de Betty. Uma vez mais iria tentar falar com a amiga, o cheiro insuportável dos gatos que esta acolhia tinha mais uma vez levado os vizinhos a fazer queixa e o atrelado corria o risco de voltar a ser confiscado.
Betty abriu a porta ainda de pijama, o que deixava transparecer a sua figura esguia, a sua face marcada pelo tempo tinha um ar inchado de quem acabara de acordar. Assim que viu a pequena figura de Martha à sua frente enervou-se e desatou a berrar com ela, como sempre fazia.
Betty tinha estacionado ali a sua caravana há uns anos, o passado turbulento deixara-a amargurada com a vida e com as pessoas e era no sossego do seu atrelado e na companhia das dezenas de gatos que recolhia que encontrava alguma tranquilidade. Martha e Lois, colegas de trabalho e moradoras na mesma rua, sensibilizaram-se com a sua situação e foram-se aproximando, criando com Betty alguns laços de amizade. Martha era uma jovem de 27 anos, solteira, trabalhadora, a sua figura pequena e cheia fazia com que tivesse alguns complexos, no entanto, era uma mulher coerente e calma que se preocupava com Betty e gostava de a ajudar. Lois era o oposto de Martha, no auge dos seus 25 anos, mantinha uma figura extremamente elegante, os seus longos cabelos loiros e os olhos verdes faziam-na uma mulher muito vaidosa. Martha falara-lhe de Betty e também ela se sensibilizara com a sua situação, no entanto, era impaciente com os desvarios desta e começava a não suportar o odor que os gatos causavam ali na zona.
Ali estava agora Martha, mais uma vez, a tentar chamar a atenção de Betty para a sua situação, mas o diálogo entre as duas não tinha nada de fácil, por mais que Martha procurasse chamar Betty à razão esta preocupava-se com outros pormenores como o desnível do seu atrelado, impaciente com as preocupações que a amiga lhe demonstrava.
Um vento frio soprava naquele início de Inverno fazendo esvoaçar os caracóis de Martha e causando em Betty um arrepio de frio por todo o corpo. Aos 34 anos, Betty era já uma mulher muito marcada, com uma figura frágil e demasiado franzina, a face aparentava uma idade que não tinha, as rugas, o cabelo já um pouco grisalho e sempre despenteado, o pouco cuidado que tinha consigo mesma tornava-a numa figura esquecida pelo mundo.
Martha conseguia sempre manter a sua tranquilidade, tentando compreender a impaciência de Betty. Mais uma vez se oferecia para juntas limparem o atrelado, talvez assim o cheiro dos gatos não se tornasse tão intenso e desagradável. Esta surgia como a única solução viável uma vez que Betty recusava-se a pés juntos a desfazer-se dos seus gatos. Eram estes que lhe faziam companhia e os únicos que Betty sentia que realmente precisavam dela por isso pô-los na rua era algo que ela jamais conseguiria fazer.
Aquele era apenas mais um diálogo em que Martha procurava despertar o cuidado de Betty mas, mais uma vez, a desatenção desta e a sua completa despreocupação tornavam as coisas extremamente difíceis e Martha saíra dali uma vez mais com a sensação de que não havia nada a fazer.

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